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— Afinal em que ficamos? Que é que quereis que eu vos conte?
— As viagens que antigamente se faziam daqui a Braga.
— Isso mesmo.
Falavam todos ao mesmo tempo, batiam palmas. Era um reboliço à volta da lareira.
— Está bem, eu conto. Mas quero-vos a todos quietinhos e calados.
Eles aquietavam-se. Ela continuava
— Daqui a Ruivães ia-se a pé ou a cavalo, ao longo de dúzia e meia de aldeias e outras tantas pondras, pontilhões e pontes manhosas.
E quantas léguas?
— Muitas! A direito, serão umas quinze. Mas pelos caminhos velhos, cheios de torcicolos, rampas e precipícios, bota lá para umas vinte bem puxadas.
— Em quantos dias?
— Um.
— Arre!
Mas era preciso sair alta madrugada, para chegar ao escurecer.
— Sem parar?
— Com pequenas pausas. Para comer e outras necessidades. Levava-se um merendeiro, rações de grão para os animais. Amesendava-se pelas estalagens, que tinham comes e bebes para os viajeiros, e estrebarias anexas para as cavalgaduras.
— E não tinham medo?
— Nunca foram assaltados?
— Felizmente não. Mas nem todos tiveram a mesma sorte. Onde quer aparecia uma cruz a pedir um Padre Nosso por alma de quem ali morrera. Estou a lembrar-me de uma à saída da Vila da Ponte, onde em tempos idos, assassinaram um homem da freguesia de Salto; e de uma outra à entrada da Ponte do Arco, hoje submersa pela albufeira da Venda Nova, onde os ladrões mataram um estudante de Calvão, que regressava de Coimbra a casa.
— Oh!!!
E a malta caiu num silêncio de meditação e horror. Logo desfeito por um mais impaciente.
— E em Ruivães saltavam para a diligência.
— Não, meu filho! Em Ruivães dormíamos.
— Nalgum palheiro?
— Em casa do Zé da Neta, num sobrado com cinco leitos, onde nos deitávamos dois a dois.
— Despidos?
— Não sejas maliciosa, que Jesus não gosta. Mulheres de saiote e corpete, homens em camisa e ceroulas.
— Toda a noite?
— Bosteve. À uma da manhã, tocava a cometa. Meia hora depois partia a mala-posta.
— Que era uma carruagem puxada a cavalos?
— Cinco. Duas parelhas e um à frente, o galera.
— A que velocidade?
— Mais ou menos uma légua por hora.
— Por esse andar...
As duas e meia parávamos em Salamonde, à porta do professor, para recolher a mala do correio, que ele atirava da janela para o tejadilho. Uma noite, com o sono (julgo eu, muito embora outros falassem em vinho) em vez da mala, atirou as calças...
— E depois?
— Viu-se em calças pardas com o correio-mor, que levou aquilo à conta de desfeita.
— Quantas pessoas transportava a diligência?
— A lotação eram dez. Seis dentro e quatro ao relento. Mas, se fosse caso disso, os Caniçós, que assim se chamavam os donos e boleeiros, metiam lá outros tantos. Em plano e ao baixo. Que nas subidas, não custava nada: os passageiros iam a pé. Os Caniçós gritavam; Folga ós cavalos! E toda a minha gente apeava. Assim acontecia logo a seguir à taberna da Maculina, no Sudro. Palmilhávamos a rampa do Cubo, das Gavinheiras, pela Senhora do Leite, até à capela de S. Brás, no Penedo. Daqui à Cruz de Real era mais ou menos plaino. Mas muita curva. Nas Cerdeirinhas matávamos o bicho e fazíamos transbordo para a diligência de Vieira, que nos levava à cidade, por Passadouros, Igreja Nova, Frades, Rendufinho, Arcas, Pinheiro Rita, Braga, onde apeávamos à porta do Gregório por volta das onze horas, meio-dia. Algum de vós já foi a Baga?
— Não senhora!
— Pois se algum dia lá fordes e quiserdes saber onde era o Gregório, procurai a confeitaria Benamor, junto da Arcada. Era ali. Que mais quereis saber.
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Tempo de ferias e de por a leitura em dia com um livro do escritor barrosão Bento da Cruz, mais um onde ele faz uma referencia a Ruivães e à importância que a Vila tinha em tempos antigos.
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