domingo, 30 de março de 2008

Os nossos escritores: A Cigana



São apenas sessenta páginas de “Linda da Serra”, edição de autora. Mas, é uma corrente límpida de beleza e simplicidade que, por vezes, entontece de encanto. Sim, belo e simples, porque o belo banha-se sempre de simplicidade. Nesta corrente, há ondas de mística, e a mística expressa-se no sublime. Este, que é normalmente indizível, torna-se palavra neste livrinho, porque envolve a vida e toca a transcendência: “Toda a palavra é pouca para falar do indizível, para mostrar o inefável... a beleza que têm as coisas simples não passa pelo discurso e tão só pela comunhão de um sentimento partilhado no silêncio...” (pág. 42). Como escreve a autora na contra-capa: “Este pequeno texto mistura prosa com poesia sobre a mesma temática: a saga da vida e a mística da experiência...”. E, assim, torna-se “palavra”. Toda esta obra se banha de divino: “O nosso dono é o ontem, o “hoje e o amanhã. É Deus, Criador e Senhor de tudo quanto existe...” (p. 55). Mas é também muito humana: “Quando casada civilmente me preparava para descer ao Alentejo, vislumbrei que, de novo, me enganara no caminho... Afinal, nunca vivi com o noivo e nunca nos casámos verdadeiramente, porque só há casamento diante de Deus. Os papéis para mim nada significam…” (p. 56). O livrinho é um triângulo amoroso: a Cigana, a Autora, o Alentejo: “Este pequeno livrinho conta a história de uma égua, a Cigana, e não menos importante, é a história paralela de alguém que quis experimentar a vida num Monte Alentejano muito antes de se ter apaixonado” (p. 4). …, portanto, biográfico, real, até porque “a perfeição é um ideal, um valor absoluto; nós somos seres finitos sujeitos a cair... Falhamos e erguemos o rosto na direcção do Poente...”. Li e reli, porque o belo, por vezes, não se capta à primeira, sobretudo os dois capítulos mais belos: “O Amanhecer no Monte” e “O Pôr-do-Sol no Monte”, e ainda os três poemas. São testemunhos de simplicidade, autenticidade (e de beleza) os capítulos mais biográficos “O Dono da Cigana” e “A Cigana e Nós”. Para terminar esta tentativa de análise de uma obra que me tocou (e uma análise não é necessariamente descomovida) mais uma citação exemplar: “Dentro do Monte, o sol arredondado e livre aqueceu o Lar e a lua baila frente á porta atravessando a escuridão, iluminando o rosto dos que esperam o último Sol, Fonte de Luz, Criador e Senhor de toda a Vida”. Não perca, leitor, a oportunidade de se banhar na luz deste belo livro.









5 comentários:

Kamil disse...

É pena que as pessoas de Ruivães se interessem tão pouco por cultura e apenas se importem com as festas, os comes e bebes,a aparência, o largo da estrada.Enfim sinais decadentes de uma vila em que à sua história deveria corresponder uma população com igual valor!!!

Anonymous disse...

Acabei hoje de ler este livro e gostei, porque também conheço o alentejo desde quando lá cumpri o serviço militar.
A autora conhece muito bem pessoas e sítios e está muito bem documentada sobre a maneira de ser e de viver daquelas pessoas, com quem lidou muito proximamente. Passei muitas vezes por Alpalhão, onde parava para jantar num restaurante se bem me lembro chamado Regata, onde faziam um achegã muito bem feito.
Gostei de todos os capítulos e a minha opinião é identica ao da pessoa que faz a crítica literária.
A vida no monte, a cigana e nós e o dono da cigana são capítulos muito bem escritos, que toda a gente gostará de ler. A vida num monte não deve ser igual à de uma vila do Minho; a cigana era um animal de luxo, que tinha uma relação especial com Linda da Serra e o Sr. Professor.
O dono da cigana é um alentejano verdadeiro, com coisa boas e más, mas que o balanço da pessoa em si é muito positivo, deve ser uma pessoa sui géneris e interessante que gostaria de conhecer.
Linda da Serra é pseudónimo e é pessoa daqui natural. Gostei muito do que escreveu e da maneira como escreveu. É uma pessoa sensível, culta e for do comum, à altura do Sr. Professor de quem fala e de quem nos descreve a personalidade. Fica-lhe aqui uma proposta de escrever também sobre pessoas sítios e factos da terra donde é natural para com os pormenores que tão bem sabe fixar enriqueça também a terra onde nasceu. O Jornal de Vieira merece também felicitações por ter dado a conhecer este livro que até a capa é bonita.
Muito obrigado

Ruivanense Adoptivo disse...

A Cigana é um livro sublime em que a Autora nos revela a sua passagem por terras alentejanas e também as suas vivências num monte do alentejo, onde uma égua com o nome de Cigana é um dos personagens deste livro, ao lado dos burros, da mula, etc.
Ainda bem que há pessoas com esta capacidade de observar e de comunicar depois o que viram e viveram; o Alentejo e o Minho são naturalmente muito diferentes mas até parece que neste livro se tornam complementares e se completam mutuamente. Lendo este ivro, com todo o seu colorido e com todos os pormenores que Linda da Serra nos faculta, parece que também nós somos actores neste palco.
Obrigado, Linda da Serra

tão perto e tão longe disse...

A autora do livro teve a coragem de em forma de romance e poesia nos mostrar um pouquinho da alma alentejana e da alma da gente. É uma história encantadora, vivida ao arrepio da gente vulgar. Felicito a ousadia de se expor de forma simples, genuina e interessante. É um livro comovente ...
ficamos à espera de mais...

linda da serra disse...

A escrita é um prazer. Publicar é que é mais difícil. Mas como nunca tive pretenções de ser célebre e rica, tenho de poupar o dinheiro para outras coisas essenciais à vida.
Até porque fazer um livro com Edição de Autor dá muitas voltas e despesas. É um luxo a que só alguns escritores se podem dar.
Mas prometo mais, se Deus quiser, logo que posso.