De seu nome Alexandre Luís Pereira de Oliveira, esta figura singular de Ruivães, foi durante a sua vida vítima de uma grande infelicidade, que era a sua deficiência, o que lhe valeu ser tolerado por alguns, mas mal amado por muitos para quem era apenas o “mudo de Vale”.
Eu tinha apenas menos oito anos que ele, e vivi o tempo em que ele divertia as pessoas quando aos domingos após a saída da missa e a troco de uma moeda subia a escadaria da casa sobranceira à fonte, passava para a varanda e dali imitava o sr. Abade no púlpito no sermão dominical.
O pessoal delirava,riam-se a bandeiras despregadas, mas a mim metia-me pena não ele, que coitado não discernia, mas as pessoas que o incentivavam e o levavam a cometer o que eu na base da minha já formação religiosa, considerava um pecado.
Outros, pagavam-lhe bebidas {que como é evidente o transtornava) até ao ponto de o verem embriagado e nisso verem mais uma forma de divertimento.
Lembro-me de um dia na festa de S. Bartolomeu, toldado pelo álcool, chorava como um perdido e foi refugiar-se debaixo da pista de carrinhos de choque com eles em movimento, o que levou à sua interrupção e foi o cabo dos trabalhos para de lá o tirarem.
Um dia, não sei se a família ou quem foi, conseguiram o seu internamento na Casa Pia,mas a viagem era dispendiosa o que levou a gerar-se um movimento para conseguir o dinheiro necessário.
Mobilizaram-se os alunos da escola para fazer o peditório, e a mim tocou-me junto com a “Lai do César” deslocarmo-nos para fora da vila.
Ainda hoje me custa a querer, como eu com sete ou oito anos pedimos boleia ao camionista da empresa Campos Ferreira que de Braga ao Iongo da E.N.103 fazia entrega de mercadorias, e Iá fomos em cima da carga até Ferral, aproveitando as paragens para fazer o peditório, munidos de uma justificação para o efeito passada pela D. Aurora, a professora.
Ao chegar a Ruivães, o Alexandre presenciou a entrega do dinheiro obtido, e ainda hoje sinto a ternura com que nos abraçou, a mim e à Lai.
Lá foi, e passados alguns anos voltou a Ruivães, homem pacato e sempre sorridente, a saber ler e escrever bem como a entender a língua gestual.
Viria a “estabelecer-se” no largo da vila com uma caixa de engraxador, o que lhe proporcionava um excelente ganha pão.
Então, sempre que me deslocava a Ruivães em férias, vinha ao meu encontro e com gestos me afiançava que jamais esqueceu o meu contributo para a sua ida para Lisboa.
O ano passado ainda, entretanto utente do Lar, não faltou aquele abraço. Este ano já não acontecerá, porque em Maio entregou a alma ao criador.
Perdi um amigo, que Deus o tenha junto a si.
Manuel Joaquim F. Barros
2018-08-30
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