Entrevista a David Machado
O escritor David Machado nasce um pouco por acaso, mas ao fim de alguns
anos os seus romances chegam a milhares de leitores portugueses e, por estes
dias, até ao cinema com a adaptação do romance Índice Médio de Felicidade.
Quando resume como tudo aconteceu até parece simples: "Estava sem nada
para fazer, era verão e ia à praia, mas, passadas duas ou três semanas, já não
tinha mais nada para fazer. Como andava a escrever qualquer coisa, resolvi
investir mais tempo num romance." Resultado: "Estive três meses
fechado em casa e escrevia oito a dez horas por dia." Confessa que
escrevia "de uma forma muito amadora e despretensiosa" e que quando
decidiu escrever aquele romance "foi sem intenção de publicar". Qual
era a intenção? "Queria escrever um romance." O que fez? "Nessa
altura acabaram por se meter outras escritas pelo meio, fui fazendo uns contos
e comecei a enviar coisas para o antigo DN Jovem." Como lhe começaram a
publicar alguns desses textos, passados esses três meses já não fazia sentido
nenhum para David Machado voltar a concorrer a um emprego em função seu curso:
Economia. Tinha entrado na vida profissional, mas foi ocupação de pouca duração
pois acabou no desemprego. Uma coisa é certa, os seus livros estão publicados
em mais de uma dezena de línguas.
Perder o emprego acabou por ser uma situação
favorável?
Sim, no meu caso foi mesmo um empurrão
que me deram, até porque não sei se alguma vez teria tido coragem de dar esse
passo.
É da opinião de que é fundamental escrever a tempo
inteiro?
No meu caso sim. Não sei se isso
funciona para toda a gente, mas no meu caso sei que preciso de muito tempo para
pensar, e já no princípio tinha consciência disso, de que as viagens de carro
ou de metro entre o emprego e casa e de casa para o emprego não me chegavam.
Nem apenas sentar-me à noite ou aos fins de semana a escrever, porque
faltava-me o tempo para pensar. No entanto, hoje é possível que já me cheguem
poucas horas porque tenho outro traquejo e as coisas mais sistematizadas na
cabeça. Naquela altura, não sabia como é que se escrevia um romance!
Hoje não há muitas viagens de metro ou de autocarro,
no entanto não faltam as de promoção e divulgação dos livros. Gosta dessa parte
da vida do escritor?
É verdade que existem essas viagens, mas
mesmo assim considero que não estou tão ocupado como se tivesse um emprego,
como aconteceu em determinada altura - trabalhava no Instituto Nacional de
Estatística -, agora o que me ocupa muito são as visitas a escolas e
bibliotecas em Portugal e festivais e encontros de literatura lá fora.
E isso não o distrai nem cansa?
Para já não me cansa, também porque a
verdade é que para mim é uma coisa muito recente. Até ao Índice Médio de
Felicidade, ou seja, até ao meu romance anterior, não tinha assim tantas
solicitações. Umas duas ou três viagens por ano, portanto, isto ainda é um
pouco novidade e para já não me cansa.
Não o incomoda estar longe dos livros?
Não, porque na verdade é que quando vou
para festivais literários estou muito mais perto dos livros do que em casa ou
na minha vida quotidiana. É uma vida familiar.
Nem longe do livro que está a escrever?
Tenho conseguido partir o tempo ao longo
do ano para ter períodos só de escrita e outros em que viajo mais, de promoção
por exemplo. Isso coincidiu com este último livro, o Debaixo da Pele, em que
tenho três partes. Ou seja, foi mais ou menos isso que se passou, escrito em
três períodos longos fora de viagem.
Então, a estrutura do livro deve-se à sua própria
vida?
Não sei deve exatamente, mas acabou por
se adaptar bastante bem. Quando estava a escrever a última parte do romance
ainda me ausentei umas vezes, fui ao Brasil e a Moçambique, mas foram situações
pontuais que não estragaram a dinâmica. Mas há outra coisa: desde que comecei a
escrever sempre prezei muito as pausas no trabalho, estar uma semana ou um mês
sem pegar no livro, posso até estar a escrever outra coisa qualquer, essa pausa
só cria uma distância em relação ao que escrevo. E quando regresso ao trabalho,
olho para o que escrevi com uma frieza tão grande que às vezes até me prejudica
porque torno-me demasiado crítico de mim próprio, o que também é bom.
Essa falta de distanciamento acaba por prejudicar
muitos livros pois sente-se que não dormiu na gaveta muito tempo. Concorda?
Não sei bem, porque terminei este livro
muito próximo da data de publicação. Mas concordo que quanto mais distância
criarmos em relação ao que escrevemos melhor faremos o trabalho da edição e das
revisões. Que é, talvez, a parte mais importante de escrever um livro. É na
revisão que cortamos tudo o que não faz falta, pois escrevemos sempre demais.
Mas concorda que a maior parte dos livros que estão a
ser publicados não dormiram o suficiente?
Não tenho essa estatística feita. Não
sei, acho que há de tudo. Hoje, quando os livros são maus deve-se a várias
razões. Considero que em faz falta em Portugal editores preocupados com o
trabalho de edição, isso poderia evitar esse tipo de situações em que os livros
deviam ser mais maturados. A ideia que os autores têm é a de que o editor
existe só para pressionar e dizer "venha lá, venha mais um livro". É
sempre importante haver alguém que vá orientando.
Nunca fica irritado com as sugestões?
Não. Nunca, nunca. Enfim, eu confio
bastante na opinião da minha editora e quando me expõe alguma coisa ou algum
problema que seja mais complexo argumenta o suficiente para eu perceber. Muitas
vezes até fico chateado comigo por ter falhado ou ter feito algum erro, pois
agora vou ter de solucionar e arranjar outra maneira de o fazer.
Daqui a dez livros ainda será assim?
Acho que sim. Cada vez mais sinto que
isso é importante. Não posso garantir, mas para mim é mesmo cada vez mais
importante esse trabalho do editor ou o livro seria um objeto pior.
Foi por isso que foi mudando de editora?
Publiquei um romance, contos e alguns
livros infantis na Presença, depois mudei para a D. Quixote no romance e os
infantis foram para a Alfaguara, precisamente porque não havia esse trabalho
com o editor.
Este livro demorou três anos a ser escrito. Não é
muito tempo?
Foram mais ou menos três anos, mas
também fiz muita coisa entretanto porque o sucesso do Índice Médio de
Felicidade obrigou-me a fazer muita promoção e também a escrever o guião do
filme sobre esse livro .
O Índice Médio de Felicidade tornou-se quase o início
da carreira?
Visto de fora pode parecer, mas para mim
não. Publico livros há onze anos e o meu início da carreira é outro. Até
entendo perfeitamente que se veja desse modo devido às traduções e aos prémios,
mas esse nem foi um livro que me marcasse. Marcou-me na medida em que um
romance marca, pois é um trabalho longo, mas não tanto como Deixem Falar as
Pedras, porque é um livro que está demasiado próximo de mim. Eu sou muito
parecido com a personagem Daniel, daí que só tenha demorado nove meses a
escrevê-lo. Foi menos refletivo.
É autobiográfico?
Não é de todo autobiográfico, é mais a
questão da temática estar mais próxima de mim. Saiu-me de uma forma muito mais
natural e deixou menos marcas. No entanto, para mim está muito longe de ser o
início de uma carreira, foi só mais um livro que escrevi.
O livro que mudou tudo?
Mudou muita coisa, muita. O romance teve
muita promoção em Portugal, como nunca tinha tido com livros anteriores, à
exceção os infantis. Sobretudo após o prémio da União Europeia é que mudou
tudo, mesmo que o Tino Navarro já tivesse vindo ter comigo para comprar os
direitos de adaptação para cinema.
Os leitores vão gostar mais do livro ou do filme?
O filme está muito próximo do livro,
claro que no cinema, normalmente, temos de cortar algumas cenas porque não é
possível pôr tudo o que há na narrativa. Mas diria que está muito aproximado do
original e acredito que os leitores irão gostar do que foi feito. Por outro
lado, se estiverem muito agarrados ao livro podem desgostar e ao repararem na
sua semelhança optarem pelo romance. Não sei dizer o que irá acontecer,
esperemos pelo filme no cinema e então ouviremos as opiniões. Estou mais
apreensivo com aquelas pessoas que nunca leram o livro e que agora vão poder
chegar a estas personagens através do filme. Essas preocupam-me mais.
A história aponta muito para um leitor no início da
vida adulta. É o seu leitor?
Não sei quem é o meu leitor. Tenho
escrito muito sobre personagens adolescentes, mas não é necessariamente igual
escrever sobre a adolescência e que os leitores sejam adolescentes. Fico feliz
quando vou a escolas e percebo que os miúdos com 16 e 17 anos se identificam
com as personagens que tenho e que se interessam pelos livros. Quanto à
pergunta, não acho de todo que os meus livros sejam especificamente para
adolescentes.
Temos uma personagem com 19 anos. Não é difícil
construir alguém assim?
É muito difícil e esse foi talvez o
capítulo mais complicado de escrever. Só estava preocupado com essa personagem
feminina e como entrar na cabeça dela, descrevendo minuto a minuto o que lhe
acontece. Vemos todos os pensamentos e gestos, as indecisões e decisões, por
isso cada frase dessa parte do livro, que tem cem páginas, foi uma batalha. Em
cada frase sou obrigado a refletir muito sobre o que realmente uma rapariga de
19 anos passou, como iria sentir-se ou decidir.
É preciso uma grande investigação?
A única investigação que fiz foi em
relação aos temas do trauma. Li alguns livros de psicologia sobre o tema e em
relação à adolescência. Creio que é necessário estar atento e não pensar assim
tanto no que se faz e, inconscientemente, pensar nas boas recordações da minha
adolescência. Não só no sentido de ter sido uma adolescência boa mas com
recordações que continuam vívidas. Ajuda que nesse tempo estivesse atento aos
meus amigos e à minha geração, ficando com tudo mais ou menos bem esquematizado
na cabeça.
É diferente dos jovens atualmente?
Creio que a essência da adolescência
será sempre a mesma. O que se passa é que o mundo à volta deles é diferente do
que no século XIX, até mesmo há vinte anos, e tudo se apresenta de outra
maneira. No entanto, acho que as angústias e as loucuras de um adolescente
partem do mesmo ponto que existia quando eu era adolescente.
Logo na segunda página tem a palavra "suicídio
entre os jovens". Não é uma questão demasiado traumática?
Não, até porque depois o livro segue
noutro sentido.
Há uma outra vez, quando ela está à janela, que também
é dramático...
E ela pondera, que seria tão fácil
saltar, não é? Enfim, acho que não há nenhum tema que não possa ser abordado
num livro. Aliás, se a literatura tem vários propósitos, diria que um deles é
precisamente refletir sobre aquilo que não é feito em mais lado nenhum - nos
jornais, nas conversas de café ou nos momentos mais íntimos de um casal -, e aí
a literatura ultrapassa tudo. Deve abordar esses extremos, deve saltar essas
fronteiras e, por isso, este livro não é sobre suicídio. À Júlia passa-lhe pela
cabeça a situação, porque acho que é uma coisa que passa pela cabeça de toda a
gente em algum momento.
Quando um escritor tem um sucesso é pressionado a
continuar no mesmo estilo. Sentiu-se obrigado a fazê-lo?
Não, o Debaixo da Pele é muito diferente
do Índice Médio de Felicidade. E foi propositado porque os meus romances são
sempre bastante diferentes. O primeiro, então, é completamente diferente dos
que se seguem porque é uma coisa mais voltada para o realismo mágico, mas mesmo
nos outros três - que são mais realistas e contemporâneos - tento sempre fazer
algo diverso pois não gosto de me repetir nem de sentir semelhanças. Prefiro
muito mais experimentar a todos os níveis, sejas nas temáticas, nas vozes ou na
estrutura narrativa.
Os leitores não pedem mais do mesmo?
Não faço ideia do que os leitores pedem
nem me interessa. Escrevo antes de mais para mim, porque quero trabalhar este
ou outro tema, esta ou outra narrativa, Ou porque leio outros autores e
apetece-me fazer alguma coisa semelhante ou ir por aquele caminho. Agora que o
livro está publicado, interessa-me que as pessoas o leiam e já quero muito saber
a opinião dos leitores. Não enquanto estou a escrevê-lo, aí é só para mim.
Ainda assim existe um tipo de leitor em que aposta
mais?
Não, de todo. Para mim o mais importante
de tudo enquanto escrevo é a história, mais até do que a própria linguagem. Sei
que em Portugal há muito esta quase batalha entre a linguagem e a narrativa,
mas eu adoro trabalhar a linguagem mesmo que tenha uma estima pelo exercício
narrativo. Gosto muito de refletir sobre isso e de pensar como é que se conta
uma história, e de saber que uma história pode ser contada de infinitas
maneiras e qual é aquela que interessa mais contar. Cada uma dessas histórias é
a narrativa de facto, por isso quando estou a escrever o mais importante é
perceber se a narrativa está a acontecer no ritmo certo, se estou a explorar
todos os caminhos que a história, as personagens e o tema me colocam. Enfim,
gosto de pensar nesta coisa de através de uma história eu poder mostrar o
mundo.
Então é a favor de o escritor ter um posicionamento
perante as grandes questões da sociedade?
Não necessariamente. Quando digo que o
mundo pode ser só uma história passada na natureza ou pode ser uma história
muito pessoal, tão pessoal que não tem nada a ver com a sociedade, aquilo que
eu gosto cada vez mais é sobre o que está à minha volta. Quando comecei a
escrever tinha algum medo de escrever sobre aquilo que estivesse muito próximo.
Por exemplo, meu primeiro romance é todo passado no Alto Minho, numa aldeia
fictícia, precisamente porque sempre passei férias na região, os meus avós são
de lá, o meu pai também, mas não quis centrar-me em nenhuma aldeia precisa para
poder fazer o que me apetecesse. Não queria estar demasiado constrangido pela
realidade, talvez por isso a opção do realismo mágico. Hoje não, cada vez mais
interessa-me falar sobre o que está aqui mesmo à minha frente.
Que é o caso deste livro, por onde passa muita da
violência doméstica que se observa na sociedade portuguesa?
Até a violência no namoro.
São temas importantes e a tratar atualmente?
Eu não escrevi o livro sobre esses
assuntos porque achasse importante falar sobre isso, queria escrever uma
história sobre duas personagens femininas. No início havia a ideia de uma
rapariga que rapta uma criança para a salvar, porque acha que a vai salvar
desta forma. Não sei de onde é que esta ideia veio, é daquelas coisas que
aparecem, mas interessou-me muito a ironia de ela estar a raptar para salvar -
que não faz sentido. Então, interessava-me perceber isso, se faz sentido ou não
e fui construindo a história a partir daí.
Existem outros temas também?
Sim, o tema da memória aparece, até
porque é uma constante nos meus livros. Portanto, esta coisa do trauma e de
porque é que ela faz isto e porque é que ela rapta a criança, porque é que ela
vem, o que é que lhe aconteceu, o que é que vem de trás para que esta situação
aconteça. Enfim, a história foi sendo construída a partir daí. E depois, se
calhar, porque eu estou muito mais atento hoje do que há dez anos àquilo que
está mesmo à minha frente, porque a violência no namoro infelizmente está aqui
mesmo à nossa frente, eu acho que de uma forma muito natural essas temáticas se
foram metendo na história, mas não foi nada muito programado.
Quando faz nascer o livro ele vem logo com um plano
esquematizado?
Normalmente tenho algumas ideias e vou
pensando muito sobre elas, posso até tomar notas, mas poucas. Quando digo muito
é mesmo assim, às vezes estou um ano noutras coisas e ando com aquilo na cabeça
até que começo as primeiras páginas. As primeiras vinte levam tanto tempo como
o resto do livro. No caso deste, foi muito mais difícil porque era como fazer
três livros, pois são muito diferentes entre si nos tons e nas personagens.
Quanto a esquematizar, só coloco umas bandeiras para me orientar, e não quer
dizer que as cumpra todas.
Quando está a escrever um livro nunca vem outro
baralhar a concentração?
Às vezes vem, mas tento não lhe ligar,
sobretudo nos momentos em que o trabalho não está a correr tão bem e é difícil
transpor para a história o que temos na cabeça e apetece ir fazer outra coisa.
Qual é o remédio para essa crise?
É só trabalhar, essa coisa de ficar à
espera da inspiração é um erro tremendo que muita gente faz quando começa a
tentar escrever um romance. Parar ao primeiro obstáculo à espera de que algo
mágico suceda não vai acontecer.
Em cada livro o escritor continua igual ou muda?
Muda de certeza. No Índice Médio de
Felicidade, que é o livro que está mais próximo de mim, talvez não me tenha
alterado muito porque sou um pouco aquilo, mas no Deixem Falar as Pedras estava
muito longe de mim. Eram temas em que não penso assim tanto no meu dia-a-dia,
pois são personagens femininas em situações pelas quais nunca passei. Mas agora
estou muito mais atento e vejo as coisas de outra maneira. Por exemplo, com os
incêndios, perguntei-me frequentemente como é que estas pessoas irão viver.
Porque o mal que nos acontece ou o que nos fazem fica metido no corpo, debaixo
da pele, como é o título deste romance. Essa é uma questão que agora existe e
antes não acontecia. Portanto, muda sim, obviamente.
Mais uma vez a questão da memória?
Sim, mas neste livro é uma memória quase
inconsciente e que a própria memória das pessoas não guarda, é a que está no
corpo. São os pesadelos que vinte anos depois ainda aparecem do nada, pequenos
medos que surgem a qualquer momento porque ouvimos um barulho que associamos a
algo que nem sequer recordamos mas que o corpo guarda. É uma outra forma de
memória.
Até quando vai resistir o seu prazo de validade para
ser o menino querido da crítica?
Eu sou o menino querido da crítica?
É o que parece atualmente.
Não sei, nunca tinha pensado que era o
menino querido da crítica. Acho que as pessoas gostam dos meus livros, também
vejo que nem sempre tenho críticas espetaculares. Ou seja, não tenho críticas
más, mas nunca tinha pensado que era o menino querido da crítica.
Tem tido uma boa receção...
Sim, nos dois últimos livros tenho tido
boa imprensa. Sou ingénuo, mas tendo a pensar que enquanto escrever bons
livros, ou livros que toquem as pessoas e as façam refletir, isso vai
acontecer. Só depende de mim, mas creio que serei o menino querido da crítica -
embora não me reveja nesse termo - até escrever um mau livro.
Quanto ao filme, já há data de estreia?
Sim, no próximo dia 31. Eu sou coautor
com o Tiago Santos, que tem escrito os filmes do António-Pedro Vasconcelos.
Foi difícil adaptar o livro?
Nada difícil. O Tino Navarro falou
comigo para ser eu a adaptar, ainda o tentei fazer, mas percebi logo que não
tinha as ferramentas. O Tiago conhece bem a estrutura de um guião e a forma
mais eficaz de apresentar as cenas.
Vamos à pergunta tradicional: que escritores o
influenciaram?
Foram muitos e, ainda bem, vão mudando
sempre.
Porque já não servem?
Não, porque procuro outras coisas e,
como vou mudando, preciso de renovar as leituras ao descobrir novos escritores
com os quais tenho mais afinidade ou que percebo que fizeram algo.
Estrangeiros, por norma?
Quando comecei a escrever estava muito
voltado para os sul-americanos: García Márquez, Vargas Llosa, Mario Benedetti
ou Borges. Em Portugal, o Saramago era uma referência por causa dos livros que
estão muito próximos do realismo mágico. Depois, pouco a pouco, fui-me voltando
para escritores mais realistas e contemporâneos, daí que goste muito de ler
escritores da minha geração: norte-americanos e anglo-saxónicos, que estão a
fazer coisas que me interessam muito ao nível da estrutura narrativa. É o caso
de Zadie Smith, Dave Eggers e Jonathan Safran Foer.
E portugueses, além do Saramago?
Gosto dos clássicos: Camilo e Eça. Li
bastante Saramago, que foi o escritor que mais me influenciou. Mas estou muito
atento aos novos escritores.
De zero a dez, quanto é que vale esta nova geração de
escritores?
Não quero dar uma classificação, mas
acho que é uma geração da qual gosto imenso, porque estão a fazer coisas muito
diferentes. Às vezes custa-me falar de uma nova geração, pois refere-se mais à
questão da idade, porque de resto acho que não há nenhum um movimento literário
a acontecer. É saudável num país tão pequeno haver escritores a fazer coisas
tão diferentes e cada um à sua maneira e com sucesso.
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